A Síndrome da Perfeição

A arte moderna libertou contempladores e artistas da perfeição imposta durante séculos. Uma perfeição que teve sua culminância, mesmo que justificada, durante o período renascentista.

Foi com o movimento modernista que se assistiu à ruptura de um realismo por vezes apenas descritivo que havia se instalado não só nas formas como nas ideias.

Essa ruptura trouxe profundas transformações na conduta social. Foram mudanças que geraram saudáveis desordens tanto estéticas quanto comportamentais. Dúvidas voltaram a ter espaço num mundo até então enganado pelas certezas e pelo reverenciamento à perfeição.

Hoje, não sei se é devido à velocidade das descobertas tecnológicas, mas assisto perplexo ao renascimento de uma crença na perfeição. Uma perfeição que transita apenas pelo externo. Mais precisamente no mundo das aparências. Cada vez mais ela é o grande alvo; uma suposta conquista vendida como fórmula de felicidade, mas que não traz escrito na bula a enorme chance de frustração.

Uma festa perfeita.
Uma viagem perfeita.
Um bebê perfeito “…já vou vendo a escola ideal para um futuro sem decepções tanto para ele quanto para mim”.

Que pena…talvez seja um vício ou a nossa cultura não sofreu mudanças nesse aspecto, mas a verdade é que os pais continuam acreditando que sabem perfeitamente o que é melhor para seus filhos.

Onde está a arte para denunciar essa cilada da completude e da perfeição que estamos nos imputando?

Os modernistas fizeram a sua parte abrindo espaço para as tantas e importantes mudanças experimentadas. Mas hoje… são outros tempos.
E a arte contemporânea? Onde está a tal instigância, o contraponto ao estabelecido, a contramão, o papel promotor da reflexão que é tão inerente à ela? Mesmo a arte tecnológica vem perdendo para as tecnologias que só promovem o consumo, especialmente se a arte continuar restrita ao hermetismo intelectual da maioria dos artistas plásticos.

A verdade é que não haverá ideias (mesmo as promotoras de interatividade ou ludicidade por parte dos museus e centros culturais) que aproximem o público de seus espaços, se os seus expositores não considerarem a sensibilidade como fio condutor entre o espectador e a obra. Seja no renascentismo, modernismo, na arte contemporânea ou qualquer outro movimento, a arte só se constitui como tal dentro do espaço sensível.

Os movimentos contemporâneos parecem sempre atentos para não serem compreendidos, o que, por algum aspecto até pode ser positivo, mas não podem negar a necessidade de serem sentidos pelos contempladores.

Nesse nosso mundo contemporâneo, em que os objetos vêm tomando cada vez mais o lugar dos sujeitos e a procura pela perfeição, tanto dos sujeitos quanto das coisas, uma obsessão; a arte é a grande saída.

Bem vindos todos os espaços de cultura e arte, assim como os artistas munidos de suas sensibilidades, mas, o que não dá para se deixar de lado é a presença de uma arte-educação de qualidade dentro e fora das escolas.

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